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Xerife de feira popular privatiza espaço público e mostra intimidade com o poder

Com acesso a informações privilegiadas, Manuel Simião Sabino Neto comanda mais de 5 mil ambulantes e é réu em ação que apura irregularidades na Feira da Madrugada

Dia 20 de setembro, sala de audiências da 24ª Vara Federal Cível de São Paulo, Manuel Simião Sabino Neto, presidente da Comissão dos Comerciantes da Feira da Madrugada Pátio do Pari (Cofemapp), começa a discorrer sobre prazos para a reabertura da feira citando datas e detalhes sobre o andamento das obras de adequação.
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“Pela minha experiência deve ser no dia 11 de novembro”, diz Sabino, com convicção. E então é interpelado pelo juiz Victorio Giuzio Neto. “Onde o senhor consegue tais informações?”
Reprodução/Facebook
Manuel Simião Sabino Neto ao lado da vice-prefeita de São Paulo, Nádia Campeão
Pego de surpresa, Sabino, que não exerce cargo público, disse que solicita à prefeitura, recebe autorização para entrar no local das obras – limitado para os demais comerciantes — e que costuma dar plantão no 35º andar do prédio onde funciona a Secretaria das Subprefeituras até conseguir “três minutos” da atenção do secretário das Subprefeituras, Chico Macena, um dos homens fortes do governo Fernando Haddad (PT).
O episódio acima exemplifica o poder de Sabino, o xerife da Feira da Madrugada, conglomerado de barracas onde mais de cinco mil comerciantes vendem praticamente tudo a preços populares em um terreno desocupado pertencente à União no bairro do Pari, na região central de São Paulo, interditada desde maio por questões de segurança.
O que despertou a atenção do juiz federal foi a intimidade de Sabino com assuntos internos da administração municipal sendo que o presidente da Cofemapp é réu, ao lado da Prefeitura e da União, na ação popular que apura construção ilegal de lojas no estacionamento da feira.
Sabino é citado em pelo menos 12 representações feitas ao Ministério Público como líder de um grupo responsável por uma série de irregularidades cometidas na feira.
Negociações 
De acordo com as representações, integrantes da Cofemapp desapropriam e negociam boxes e posições nas áreas mais valorizadas, permitem a ação ilegal de ambulantes mediante pagamento de propinas, ocuparam ilegalmente espaços da prefeitura, cobram “condomínio” de R$ 250 proibido pela prefeitura e maquiam boxes flagrados vendendo produtos pirateados ou contrabandeados, mudando seus números de registro. As cifras citadas nas denúncias estão na casa dos milhões de reais.
Sabino escuta todas as acusações sem perder a tranquilidade. Atribui tudo à inveja dos concorrentes. “Sou citado porque sou a pessoa mais importante da Cofemapp. Já fui ouvido várias vezes pelo Ministério Público, vou a todas audiências da Justiça Federal e até hoje não encontraram nada”, disse ele. “Noventa por cento de todos aqueles que me denunciam já procuraram fazer algum tipo de parceria comigo”, completou.
Nascido em Guarulhos, Sabino chegou à Feira da Madrugada há cerca de quatro anos, quando o local era administrado pelo coronel da reserva da PM João Roberto da Fonseca, indicado pelo então prefeito Gilberto Kassab (PSD) para ser o gestor da área recém-assumida pela prefeitura depois de mais de cinco anos de ilegalidade.
A estrela de Sabino começou subir dias antes da ação da Operação Delegada que fechou a feira em 2011. Segundo testemunhas, munido de informações privilegiadas ele avisou os comerciantes sobre a ação. A partir de então ganhou fama de protetor da feira, e a Copemapp se estabeleceu como a principal entre pelo menos 14 entidades que disputam o direito de representar os feirantes.
A reportagem teve o primeiro contato com Sabino quando a feira ainda estava aberta, no ano passado, durante a disputa eleitoral. Seu principal adversário, o chinês Mario Ye, havia anunciado apoio a Celso Russomanno (PRB), e a Cofemapp buscava aproximação com o PT.
Sabino ocupava duas salas em uma área da prefeitura. Para ter acesso ao local era preciso autorização de um segurança. Sentado em uma das salas, Sabino, com suas correntes e anéis de ouro, distribuía ordens com autoridade.
Contribuição voluntária 
A Cofemapp cobra R$ 250 a título de contribuição voluntária de seus associados mas, segundo relatos, pressiona e intimida comerciantes que se recusam a pagar. Por seis vezes a entidade solicitou formalmente à prefeitura autorização para gerenciar a feira e teve os pedidos negados.
“Eu rasgava os boletos na cara dos homens da Cofemapp até que eles passaram a me intimidar e tentaram três vezes tirar meu box”, disse Francisca de Oliveira da Silva, 37 anos. “Eles diziam que para trocar o tipo de mercadoria precisava dar uma procuração para a Cofemapp, além de pagar a mensalidade”, conta.
A denúncia mais grave, no entanto, diz respeito à venda de espaços e lojas. Testemunhas ouvidas pelo iG dizem que o comércio de boxes e posições acontece mesmo com a feira fechada e a fiscalização dura da Justiça Federal. Os preços variam entre R$ 180 mil e R$ 300 mil, conforme a localização.
Propriedade perpétua 
iG teve acesso a um documento de “cessão de direito de uso possessório de forma irrevogável, irretratável e perpétua” firmado entre Luis Carlos Salomão Junior, dono do box número G-3ª e o chinês Bingfeng Guo. Sabino assina o documento com a observação “somente sou testemunha de remanejamento do box sem venda!”. A data do contrato é 21 de março de 2013, já na administração Haddad. O cedente, Salomão, não assina o documento. O box G-3ª não consta da relação publicada na portaria da prefeitura no dia 28 de dezembro que regulamentou a atividade no local.
Questionado sobre o documento, Sabino disse se lembrar do negócio e se justificou dizendo que o “remanejamento” foi gratuito. Apesar de negar a participação no negócio, ele defende a comercialização de espaços. “O que a prefeitura proíbe é passar o papel, o documento. Isso é ilegal. O cadastro é pessoal e intransferível. Mas uma relação entre eu e você é entre eu e você. Certo?”.
Segundo ele, as pessoas têm o direito de vender seus espaços porque “chegaram lá antes da prefeitura”, apesar de o terreno pertencer à União.
Sônia Aparecida Ramos, 64 anos, vendedora de bijuterias, disse que integrantes da Cofemapp já tentaram vender seu box três vezes quando foi autuada por vender “meia dúzia” de chaveiros religiosos piratas. “Passei a humilhação de vender na porta da minha loja. A Cofemapp alugou meu box”, afirmou ela.
Perguntada se não tem medo de represálias, Sônia respondeu: “só tenho medo de não ter dinheiro para sustentar minha família”. “Se eu me desse o trabalho de fazer falsa denúncia era só pegar o telefone e ligar para um repórter oferecendo entrevistas com uma dúzia de sônias”, desdenhou Sabino.
Outro lado 
Por e-mail, a Secretaria das Subprefeituras disse desconhecer a existência de um esquema de venda de boxes na Feira da Madrugada e que qualquer informação neste sentido deve levada ao 12º Distrito Policial. A secretaria negou qualquer ligação com Sabino e disse desconhecer o fato de que ele tenha informações internas da prefeitura, embora o diálogo com o juiz tenha sido registrado em ata e presenciado por procuradoras municipais. Conforme o órgão municipal, qualquer pessoa tem acesso à portaria do gabinete do secretário e Sabino tem acesso ao local das obras porque é dono de uma lanchonete que deve se adequar a normas especiais contra incêndios.
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